A garota suspirava de frustração. Tinha mil ideias e planos que praticamente consumiam sua mente e, por vezes, a confundiam. Tinha o impulso de agarrar o mundo, de torná-lo palco de suas vontades mais íntimas, mas se via no meio de uma série de impedimentos. Não sabia por onde começar, e tampouco sabia como dar o primeiro passo para a realização de seus sonhos.
À noite, quando ninguém podia vê-la, agarrava-se no cobertor e chorava. As incertezas a consumiam, bem como o pessimismo de nunca ver-se na posição que tanto almejava. Tinha o receio de nunca conseguir ser aquela imagem formada dentro de sua mente, de nunca poder transformar-se naquela mulher que tanto admirava na frente do espelho.
Conversava consigo mesma na frente daquele reflexo, sentindo-se mais confortável do que nunca. Seus pensamentos lhe eram familiares, tranquilos e ao mesmo tempo expressivos. E essa mesma tranquilidade se dissipava na presença de outros estranhos, cujas atitudes e ideias divergiam completamente das suas. Sentia-se intimidada, diminuída, como se nada do que falasse ou dissesse seria o suficiente para mostrar seus sentimentos. Tinha a impressão de que nunca se faria entender.

Consumida pela própria intimidação, ela se afunda em taças de vinho, deixando-se levar pela quantidade certa e doce de álcool. Aplaca sua frustração com filmes no final da noite e uma boa dose de romances antigos escritos em livros quase esquecidos pelo tempo. Acalma-se por um momento pensando que todos aqueles estranhos que a intimidaram não são nenhuma entidade naquele assunto que tanto a assustara: as opiniões são apenas divergentes. Ela não estava errada aos olhos do estranho, ele apenas não entendia que ela possuía tantos valores. Via sua mente e seu corpo como um templo sagrado que não deveria ser corrompido por outros. Eram seus e nada mais.
E de repente, como se uma luz a tocasse e mostrasse o caminho, se sentia plena e calma. Sim, era apenas diferente. Queria apenas ter o prazer de mostrar ao mundo que conseguia transformá-lo num palco repleto de música, dança, teatro e poesia. Queria poder mostrar às pessoas que o mundo não precisa ser um antro de frustrações, de atitudes extremas para manter-se em foco. Basta aquela expressão e aquelas letras que tanto a confortaram quando criança. Afinal de contas, porque tudo não pode ser mais bonito?
De súbito, ela levanta encantada com o novo rumo que seus pensamentos tomaram. Como uma artista que vence os próprios obstáculos de enfrentar o espectador de sua arte, ela se levanta, olha novamente no espelho para ver aquela figura tão familiar e entende finalmente que precisa apenas enfrentar o medo. Nada, nem ninguém, poderia intimidá-la. Era autora e atriz de seu próprio espetáculo.